Meu Corpo e a Casa de Minha Mãe

 

Não moro mais

E ainda moro,

Pois desde sempre morei lá,

E vou morar eternamente

Na casa de minha mãe.

 

Deixei aquela casa

Com suas paredes cobertas de nuvens,

E continuo sempre morando por lá!

Ando, confortavelmente,

De olhos bem fechados,

Na naturalidade eclipsada

De todos os cantos daquele berço.

Meus gritos e meus silêncios,

Minhas risadas e meus soluços,

Todos ainda estão por lá,

Clandestinamente.

Em meus pátios,

Onde pinto meus oceanos,

Ainda caem as folhas dos chorões,

Nas tardes que faziam tetos gris com seus torvelinhos.

Nelas, ainda me escondo de mim mesmo,

Embaixo de alguma tábua,

Num cômodo abraço fetal em minhas próprias pernas.

Nas bergamotas, nas azedas laranjas de doce e nas urtigas,

Procuro o espanto crispado,

Para versos doces, ácidos ou ardidos.

Não moro mais e ainda moro,

No assoalho ruvinhoso,

Entalhado pelos ensejos de meus passos,

Que em seu modo rangente

Sempre me diz onde estou.

Meu corpo está fundido

Sensivelmente com cada gaveta,

Com cada muro, com cada sombra.

Deixei a casa de minha mãe,

E continuo sempre morando por lá.

A casa de meus sossegos e das minhas proteções

É a pele de meu corpo.